“Seja diverso ou seja extinto” é a prova que a diversidade é o novo Darwinismo. E bom, se me permite dizer, tá mais que na hora de evoluirmos no mundo dos jogos. Vamos passar essa fase?

A temática da diversidade já está sendo levada para vários debates, incluindo o mundo dos jogos. Não é raro vermos grandes discussões e pessoas enfurecidas porque seus personagens mudaram ou porque a chamada “cultura da lacração” chegou ao seu game favorito.

Hoje, quero tentar explicar por que a gente precisa falar sobre e ainda entender onde mora o problema. Essa é a minha visão como uma mulher branca e heterossexual, que teve o primeiro contato com videogame jogando Donkey Kong no seu super Nintendo.

Primeiramente, vamos adereçar um problema: o que aceitamos como normal?

Para responder a esta pergunta, vamos a alguns dados:

  • Segundo a Pesquisa Game Brasil (PGB), mais da metade dos gamers (50,3%) são pretos ou pardos;
  • Também de acordo com a PGB, 72% dos brasileiros têm costume de jogar games, sendo que mais da metade são mulheres;
  • Um censo realizado pelo Ministério da Cultura em 2018 mostrou que a distribuição dos colaboradores dentro das produtoras de jogos é de 20,7% mulheres e 79,3% homens.

Vamos lá. Mas o que todos esses números têm a ver com nossa experiência como jogadores?

Assim como eu, você deve ter crescido com exemplos bem clássicos de quem são os super-heróis, as pessoas que você escolhia ser quando apertava o play: Super homem? Homem aranha? Link? Mário?


Como mulher, no fundo, eu não entendia por que minha personagem precisava estar lutando de biquíni, quando o meu adversário estava com uma roupa de judô. Mas aos poucos consegui encontrar personagens femininas que eu admirava pela força e não só pela sua beleza (obrigada Lara Croft).

Durante vários anos das nossas experiências como jogadores, nós sempre jogamos como o homem branco e hetero. Isso era (e ainda é) o que mais tínhamos disponíveis no mercado de jogos. Lembra lá em cima quando eu te falei que temos poucas mulheres desenvolvedoras de jogos? Pois é, no geral a gente gosta de retratar gente parecida com a gente. E talvez devido ao fato de que 70% dos desenvolvedores serem homens (dos quais menos de 10% são negros), nossas experiências são desenhadas seguindo critérios que não são aplicáveis ao público gamer de hoje e, assim, chegamos aqui (e claro, um histórico gigante de que “mulheres não são gamers”).

Bom, não é segredo para ninguém que o Brasil não é só formado por homens brancos e heteros. Para ser bem específica, a população brasileira tem mais mulheres e mais negros. Mas então, por que ainda nos incomodamos tanto quando vemos um jogo como Last Of Us 2 ser mais criticado por sua diversidade do que por sua jogabilidade?

E se você me falar: ah, mas que diferença faz para o jogo se eu sou uma mulher negra? Porque incluir na história que o personagem que eu sempre gostei, “agora é” gay? É, de fato, isso não faz diferença nenhuma. Se me permitem voltar ao exemplo de Last Of Us 2 (ATENÇÃO: SPOILER NA PRÓXIMA FRASE), o fato da Ellie ser lésbica e fumar maconha não mudava em nada a vontade que eu tive de jogar um taco de golfe na cabeça da Abby. Então, qual é meu ponto aqui?

Se os movimentos do seu personagem, seu objetivo de jogo, o gráfico e o som do jogo e ainda a experiência como um todo são os principais pontos para jogar, por que você tá tão preocupado em ter que, de vez em quando, jogar com alguém que não é seu reflexo?

Para você, que cresceu se vendo representado nesse mundo (que, por sinal, não se limita ao mundo gamer), não vai fazer diferença. Não é como se jogar como uma lésbica vá fazer você começar a ter interesses pelo mesmo gênero, eu PROMETO! A diferença, nessas situações, atinge esses mais de 50% de jogadores brasileiros que são bem diferentes de você. São pessoas que, pela primeira vez, poderão se identificar com alguém. Imagina que, pela primeira vez, um adolescente poderá entrar em contato com algo que antes era só uma confusão na cabeça dele. Pela primeira vez, alguém vai poder olhar para um personagem da mesma forma que você olhou o Iron man pela primeira vez, com brilho nos olhos.

A diversidade nos jogos pode não trazer absolutamente nada de diferente na sua experiência de jogo se você sempre se identificou com o que viu, mas não está te prejudicando, mas ao mesmo tempo, ela está potencialmente ajudando alguém.

E bom, se você, assim como eu, no seu super Nintendo, não via problema algum em dois macacos pisando na cabeça de crocodilos do mal, tá na hora de passar a entender que quem aparece na tela é um mero detalhe para você experienciar o melhor que os jogos nos traz: a possibilidade de sermos quem quiser.

Ju Nunes, brasiliense, 26 anos, guitarrista profissional de guitar hero no ps2 (na visão dela mesma).