Assassin’s Creed Shadows: historiadora do projeto relata ataques e falta de apoio da Ubisoft

Desde que Assassin’s Creed Shadows foi anunciado, a Ubisoft se viu no centro de polêmicas envolvendo representatividade e fidelidade histórica. O jogo, ambientado no Japão feudal, traz como protagonistas o samurai Yasuke, inspirado em uma figura histórica africana que viveu no Japão do século XVI, e a shinobi Naoe. A escolha criativa, embora elogiada por muitos, gerou uma onda de críticas, sobretudo de jogadores que alegam “incoerência histórica”.

No centro dessa tempestade está a professora Sachi Schmidt-Hori, especialista em história e cultura japonesa, contratada pela Ubisoft para atuar como consultora desde 2022. Em entrevista recente, Schmidt-Hori revelou que, após o anúncio do jogo, passou a receber centenas de mensagens de ódio, especialmente de homens asiáticos do Ocidente, que a acusaram de “trair suas origens”.

“Eles me chamaram de vendida, dizendo que eu ajudava a apagar a existência de homens asiáticos”, relatou a historiadora. “O mais curioso é que, no Japão, onde a história de Yasuke é mais conhecida, a recepção foi neutra ou positiva.”

Ataques ideológicos e apropriação de narrativas

Segundo Schmidt-Hori, os ataques vieram de diferentes frentes: alguns grupos focavam na representatividade feminina, outros questionavam a figura de Yasuke como protagonista samurai. Mas o mais alarmante, segundo ela, foi o modo como certos grupos usaram o caso para propagar discursos nacionalistas e anti-diversidade.

“É uma ideologia supremacista branca, nacionalista, disfarçada de simpatia. Supremacistas brancos costumam usar asiáticos ou asiático-americanos como ferramenta para oprimir outros grupos, como negros e latinos. É típico. E é triste ver parte da comunidade asiática-americana ecoando isso.”

Schmidt-Hori explicou que qualquer tentativa de dialogar com esses grupos era infrutífera: “Eles sempre mudavam o foco da discussão para outra crítica. Nunca foi sobre fatos.”

Ubisoft ignorou os riscos, diz professora

Ainda mais grave, segundo a professora, foi a postura da própria Ubisoft diante das ameaças. Quando procurou o estúdio pedindo apoio, a única recomendação recebida foi para que ignorasse os ataques e deletasse suas redes sociais.

“Eles nunca me prepararam para esse tipo de reação. E sabiam que eu seria exposta. Eu dei entrevistas em vídeo, meu nome estava atrelado ao projeto. E mesmo assim, ninguém da Ubisoft se antecipou para me proteger.”

Essa ausência de suporte por parte da empresa gerou críticas dentro e fora da indústria. O caso se soma a outras situações nas quais a Ubisoft foi acusada de não proteger seus colaboradores diante de crises públicas — um problema recorrente em grandes produções com forte exposição.

Debate sobre representatividade e história continua

A figura de Yasuke é real e documentada: ele foi um homem africano que chegou ao Japão no século XVI, servindo ao daimyo Oda Nobunaga. Ainda que sua ascensão a samurai esteja cercada de controvérsias históricas, sua existência é um símbolo poderoso de intercâmbio cultural e rompe com estereótipos frequentes em representações ocidentais do Japão feudal.

Assassin’s Creed Shadows promete explorar essa história dentro de uma narrativa ficcional, como é tradição na franquia. Ainda assim, o jogo se tornou um novo campo de batalha para debates sobre identidade, apropriação cultural e revisionismo histórico no mundo dos games.

A Ubisoft, por sua vez, ainda não se pronunciou oficialmente sobre as declarações de Schmidt-Hori.